1.INTRODUÇÃO
Foi publicada no dia 22 de março de 2020, a Medida Provisória (MP) nº 927, que dispõe sobre as Medidas Trabalhistas Para Enfrentamento Do Estado De Calamidade Pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid19).
A MP nº 927 teve sua vigência iniciada no ato da sua publicação e sobreveio diante dos novos dilemas relacionados aos contratos de trabalho no atual momento atravessado pelo Brasil, bem como diante da premente necessidade de regular ações que já vinham sendo tomadas pelos empregadores em todo o país.
Diante da edição da Medida Provisória 927 as condutas das empresas passam a ser dotadas de segurança jurídica, tanto para empregados, quanto para empregadores.
O momento é de extrema excepcionalidade, por isso admitida a flexibilização das condições do trabalho. É importante ter em mente que existem dois prazos no cerne da discussão.
O primeiro deles é período de duração do estado de calamidade que, nos termos do decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, produzirá efeitos até 31 de dezembro de 2020.
O segundo é o prazo de vigência da própria MP 927. Necessário informar que a sua subsistência está condicionada à sua conversão em lei pelo Poder Legislativo, que deverá deliberar sobre o texto no prazo de 60 dias prorrogáveis por igual período (uma única vez). Se aprovada pelo Congresso Nacional, a medida retorna à presidência para sanção e passa vigorar como lei federal. Se rejeitada, vetada pela presidência ou não aprovada no prazo de 120 dias, deixará de produzir efeitos.
Em apertada análise do conteúdo da MP 927, verifica-se de pronto grande esforço do Governo Federal na adoção de medidas visando a preservação dos contratos de trabalho.
Isto posto, desenvolvemos o presente manual para esclarecer as medidas editadas, visando subsidiar as tomadas de decisões dos empregadores em geral.

2.OBJETO DA MP Nº 927-2020
A Medida Provisória apresenta alternativas para as empresas diante do quadro de calamidade pública como, por exemplo, a possibilidade de firmação de acordo individual escrito , àquele tratado entre empresa e colaborador de forma direta, para regulamentar temas como:
I - o teletrabalho;
II - a antecipação de férias individuais;
III - a concessão de férias coletivas;
IV - o aproveitamento e a antecipação de feriados;
V - o banco de horas;
VI - a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
VII - o direcionamento do trabalhador para qualificação(revogado); e
VIII - o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.
Importante destacar que tais medidas foram adotadas considerando o avanço do COVID-19, a ausência de representação sindical de vários setores, e a necessidade de segurança jurídica às condutas empresariais.

2.1TELETRABALHO
Pertinente ao TELETRABALHO (home office), nos termos da Medida Provisória considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador com utilização de tecnologias.
A MP faculta ao empregador a implementação  do teletrabalho, desde que notifique o empregado com antecedência de, no mínimo, 48h , por escrito ou por meio eletrônico, podendo formalizar o contrato em até 30  (trinta) dias a contar de sua implementação.
Deve o empregador arcar com eventuais ônus para essa adaptação.
Caso o empregado não disponibilize dos equipamentos necessários para a realização das atividades home office, a responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento de equipamentos  serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de 30 dias, sem que tais custos impliquem em verbas de natureza salarial.
Importante destacar que havendo a alteração do regime para TELETRABALHO, o tempo do empregado será considerado à disposição do empregador ainda que a infraestrutura não possa ser viabilizada , o que impõe prévia e cautelosa análise do empregador quanto a esta opção, de modo a evitar a conversão sem a garantia de que as tarefas poderão ser executadas.
A Medida permite o regime de TELETRABALHO inclusive para estagiários e aprendizes.

2.2DA ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS
A MP flexibiliza as regras da CLT sobre a ANTECIPAÇAO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS, ao tempo em que impõe algumas exigências, tais como, aviso prévio, escrito ou por meio eletrônico, com antecedência de, no mínimo 48h , informando o período de gozo das férias.
As férias não poderão ser concedidas com período inferior a 5 (cinco) dias  corridos.
A MP priorizou o gozo de férias, individuais ou coletivas, aos trabalhadores pertencentes aos grupos de risco do coronavírus.
Pela MP as férias poderão ser concedidas ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido, e as partes poderão negociar eventual antecipação de períodos futuros de férias mediante acordo individual escrito.
A empresa poderá interromper as férias ou licenças não remuneradas de empregados ligados à área da saúde ou atividades essenciais.
No que se refere ao pagamento do adicional de 1/3 de férias, este poderá ser feito após sua concessão, desde que pago até a data em que é devida a gratificação natalina , ou seja, até 20 de dezembro.
Caso o empregado tenha interesse em converter o seu um terço de férias em abono pecuniário, deverá requerer ao empregador dentro do prazo e estará sujeito a concordância do empregador.
Quanto ao momento do pagamento remuneração das férias concedidas, a medida permite que a empresa o faça até o quinto dia útil subsequente ao da concessão das férias .
Importante destacar que na hipótese de dispensa do empregado, as regras excepcionais quanto ao pagamento das férias deixam de ter validade, devendo a empresa pagar os direitos rescisórios do empregado na forma e nos prazos da lei .

2.3DA CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS
Sobre as FÉRIAS COLETIVAS, a Medida prevê que a empresa poderá concedê-la mediante prévio aviso de mínimo 48h, sem a aplicação de limite máximo de períodos anuais (2 períodos anuais) e o limite mínimo de dias corridos (10 dias por período), dispensando as comunicações prévias ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos .
Das regras em questão pode-se depreender, em tese, que as empresas poderiam conceder férias coletivas pelo período de 3 (três) meses, por exemplo, o que consideramos elevado risco jurídico e o evidente ônus financeiro decorrente de tal hipótese.
Deve-se observar atentamente que as comunicações aos órgãos competentes e sindicatos, por exemplo, não foram excluídas, mas apenas o seu atendimento prévio. Ainda assim, a comunicação póstuma não faz sentido para esta assessoria, uma vez que as empresas estão sujeitas a fiscalização e a possíveis relações trabalhistas dos empregados.
Logo, sobre este aspecto, é importante que a empresa documente e arquive tais providências para eventuais esclarecimentos, apresentação perante os órgãos competentes.

2.4DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
Pertinente ao tema APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS, a Medida Provisória indica a possibilidade das empresas anteciparem o gozo de feriados não religiosos de qualquer esfera, federal, estadual, distrital ou municipal, devendo notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o empregado, com antecedência de 48h, indicando expressamente os feriados em questão , ou seja, quais os feriados previstos ao longo do ano de 2020.
Esta medida poderá compor o sistema de banco de horas, devendo o empregador se ater especialmente aos feriados religiosos, que também podem entrar no mesmo sistema, desde que para estes seja firmado acordo individual escrito .
Isto posto, recomenda-se às empresas organização quanto a gestão desse mecanismo, formalizando a concordância do empregado em relação aos feriados religiosos, evitando contratempos futuros.
2.5DO BANCO DE HORAS
A respeito da modalidade BANCO DE HORAS, pela MP está autorizada a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada mediante acordo coletivo ou individual formal, para compensação no prazo de até dezoito meses contados da data de encerramento do estado de calamidade pública .
São, portanto, UM ANO E MEIO para compensação das horas negativas acumuladas em quarentena, sem a necessidade de pagamento de hora extraordinária, caso a jornada de trabalho se estenda além do normal, limitada a 2h por dia.
A adoção do banco de horas deve ser utilizada com cautela, uma vez que a MP não tratou da hipótese de demissão do empregado com saldo de banco de horas e a CLT limita a possibilidade de desconto da remuneração devida em caso de demissão .

2.6DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO
A Medida Provisória prevê a suspensão da obrigatoriedade de realização imediata dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto os exames demissionais .
Os prazos para realização dos exames são postergados para até 60 (sessenta)  dias após o fim do estado de calamidade pública, salvo os casos em que há riscos à saúde do empregado, o qual deverá ser indicado pelo médico do trabalho a necessidade de sua realização.
O exame demissional poderá ser dispensado caso o empregado tenha realizado exame médico ocupacional dentro do período de 180 (cento e oitenta) dias .
Quanto aos treinamentos previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho, ficam suspensos, devendo ser realizados em até 90 (noventa) dias após o fim da data do estado de calamidade pública.  Entretanto, os treinamentos, durante o estado de calamidade pública, podem ser realizados na modalidade de ensino à distância.
As comissões internas de prevenção de acidentes foram mantidas, e a processos eleitorais poderão ser suspensos até o final do decreto de calamidade pública .

2.7DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO
Este ponto da MP foi o mais discutido, considerando o fato de prever a suspensão do contrato de trabalho para encaminhar colaborador para curso ou capacitação profissional.
Ao estabelecer as regras deste artigo, falharam ao prever que a empresa poderia deixar de pagar salário por até 4 meses. Por certo que seria julgado como inconstitucional.
Antes mesmo de aguardar posição do Congresso Nacional, o Presidente Bolsonaro editou a Medida Provisória nº 928, revogando o artigo 18 , da Medida Provisória nº 927.

2.8DO DIFERIMENTO NO RECOLHIMENTO DO FGTS
Ficará suspensa a exigibilidade do FGTS em relação às competências de março, abril e maio de 2020, que possuem vencimento em abril, maio e junho de 2020 .
Esta suspensão não dependerá de número mínimo de funcionários, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica ou de adesão prévia.
Estes meses poderão ser pagos de forma parcelada, a partir de julho de 2020, sem incidência de atualização, multa ou encargos da Lei nº 8.036/90.
Para gozar desta prerrogativa o empregador precisa declarar as informações até 20/06/2020 para constituir o crédito.
Mais uma vez a rescisão invalida as regras de flexibilização, devendo a empresa estar atenta e este detalhe.

2.9JORNADA DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE
Os estabelecimentos de saúde poderão, mediante acordo individual escrito, prorrogar jornada e adotar escalas complementares, mesmo em atividades insalubres e em jornadas de 12x36 .
A compensação destas horas deverá ocorrer nos 18 meses  seguintes ao término do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneração como hora extra.

2.10PRAZO EM AUTOS DE INFRAÇÃO DE FGTS
Ficam suspensos os prazos para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS .

2.11DOENÇA OCUPACIONAL
Os casos de contaminação pelo coronavírus não serão considerados ocupacionais , exceto mediante comprovação do nexo causal.

2.12ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS
Poderá ocorrer prorrogação de acordo ou convenção coletiva vencidos ou vincendos, no prazo de 180 dias, contados da entrada em vigor da MP, a critério do empregador, por mais 90 dias .

2.13FISCALIZAÇÃO TRABALHISTA
Durante 180 dias, contados da entrada em vigor da MP, os Auditores Fiscais do Trabalho atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às irregularidades  taxativamente descritas nos incisos do artigo 31, da MP nº 927.

2.14MEDIDAS TOMADAS ANTES DA MP Nº 907-2020
Ponto controverso, passível de ser declarado inconstitucional, o artigo 36 da MP, o qual convalida as medidas trabalhistas adotadas por empregadores nos 30 dias que antecederam à data de entrada em vigor da MP, desde que não contrariem a sua disposição.

3.CONCLUSÃO
A Medida Provisória nº 927 editada pelo Governo está vigente e ajuda de certa maneira a nortear e fundamentar as medidas mais duras das empresas nesse momento de inevitável impacto na sua produtividade.
No entanto, quando se trata de relações de trabalho, as tomadas de decisões precisam ser pautadas no respeito, bom senso, empatia, e justiça, uma vez que esta medida provisória, depende de aprovação para que seja convertida em lei e dela poderão advir possíveis reclamações trabalhistas.
Podemos concluir que as melhores soluções para os empregadores dependerão significativamente da realidade de cada empresa.